quinta-feira, 10 de novembro de 2011


ESSE RESTO SOU EU

Não te iludas, amor, mete isto na cabeça:
Eu não sou o doce docinho do céu
que tu pensas que eu sou.
Estás a ver o resto queimado
no fundo da forma que tens nas mãos?
Esse resto sou eu.
Sim, amor. Sou eu.
E não faças essa cara de espanto
ou melhor, faz as caras que quiseres
mas poupa-me à narrativa.
Não posso ser mais claro.
Tens-me aí no fundo dessa forma
e não vejo forma de parecer outro.
Outro ou esse outro
que tu construíste na tua cabeça
desde que me viste em  Pasadena.
Mimei-te e tu fizeste a tua parte.
Foi bom, não digo que não.
Foi muito bom mesmo.
Uma loucura! 
Uma saudável loucura!
Mas não é essa a face da verdade
que ambos interpretámos.
A verdade, a verdadeira verdade
está agora nas tuas mãos.
Compreendo que te sintas horrível,
que te repugne saber-me um resto,
um resto de doce carbonizado
e que me queiras deitar fora…
Fá-lo. Estás no teu direito. Fá-lo.
Mas não para um qualquer contentor camarário,
peço-te.
Lança-me antes à terra,
ao pedaço de terra do nosso jardim
onde, quem sabe,
por qualquer efeito de transmutação
eu venha ainda a ser, sei lá,
um esmerado jasmim?!


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